quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Toxicologia Forense


A toxicologia forense insere-se no âmbito da toxicologia analítica tendo, por conseguinte, como principal objetivo a detecção e quantificação de substâncias tóxicas. Contudo, a atividade do toxicologista forense aplica-se a situações com questões judiciais subjacentes para as quais importa reconhecer, identificar e quantificar o risco relativo da exposição humana a agentes tóxicos. Como tal aproveita conhecimentos alcançados em praticamente todas as áreas da toxicologia moderna.
Até ao século XX, a toxicologia forense limitava-se a estabelecer a origem tóxica de um determinado crime; o “toxicologista” atuava diretamente no cadáver com a mera intenção da pesquisa e identificação do tóxico. Atualmente o campo de ação desta ciência é mais vasto, estendendo-se desde as perícias no vivo e no cadáver até circunstâncias de saúde pública, tais como aspectos da investigação relacionados a eventual falsificação ou adulteração de medicamentos e de acidentes químicos de massa. No caso das pessoas vivas estes exames têm, sobretudo a ver com perícias toxicológicas para rastreio e confirmação de drogas de abuso no âmbito dos exames periciais ou médicos para caracterização do estado de toxicodependência e com o regime legal da fiscalização do uso de substâncias psicoativas nos utilizadores da via pública. Neste último caso a participação, a Polícia Técnico-Científica compreende, além dos procedimentos para garantia de cadeia de custódia de produtos e amostras, os exames de quantificação de álcool etílico no sangue, e o rastreio e confirmação da presença das diversas substâncias na urina e no sangue, respectivamente. Os exames no vivo têm como objetivo a avaliação da intoxicação como circunstância qualificadora de delito, como causa de periculosidade ou de inimputabilidade. Em caso de morte por intoxicação que se enquadra no âmbito da morte violenta, existe obrigatoriedade de, nesta suspeita, se proceder à autópsia médico-legal, e conseqüentemente, em geral, à requisição de perícia toxicológica (Código de Processo Penal - Decreto-Lei Nº 3.689, se 3 de outubro de 1941; Código Penal - Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940). As intoxicações podem ser criminais, legais (pena de morte), acidentais (alimentares, mordedura de animais, absorção acidental, medicamentosas) ou voluntárias (lesões auto infligidas, toxicodependência, terapêutica).
            Fatores importantes para que o resultado obtido das análises seja confiável: cadeia de custódia, que envolve a documentação desde a coleta da amostra até a obtenção dos resultados finais das análises; manuseio correto das amostras; correta identificação de cada amostra recebida e integridade da mesma.
            As matrizes biológicas utilizadas na caracterização da exposição humana, em testes in vivo, são: urina, plasma, sangue, saliva e cabelo, podendo ser utilizadas matrizes alternativas como suor, unha mecônio, tecidos e cabelos de recém-nascidos, como exemplifica a verificação de suspeição de exposição intra-uterina.
As matrizes biológicas normalmente utilizadas na caracterização da exposição humana, em análises post mortem, são: sangue total (aorta, cavidade cardíaca e femoral), humor vítreo e vísceras, como fígado e rins, e cérebro.
Conforme a especificidade do caso e o tipo de análise pretendida, são realizadas a seleção e colheita das amostras mais adequadas. Desta forma, existem análises que requerem apenas um tipo de amostra, enquanto outras ficarão incompletas se não forem enviadas diversos tipos de amostras. Por exemplo, as determinações de alcoolemia (etanol no sangue) ou de carboxihemoglobina (monóxido de carbono presente na hemoglobina sanguínea) exigem apenas um único substrato (sangue). As amostras destinadas a exame toxicológico não devem ser adicionadas de qualquer preservante ou conservante, porque a detecção de qualquer substância, seja ela adicionada ou não, poderá ser relevante do ponto de vista toxicológico. Tal como em qualquer regra existe exceção no que se refere à amostra de sangue destinada a doseamentos de álcool, cocaína ou ácido cianídrico, à qual se adiciona fluoreto de sódio na concentração aproximada de 1% (peso por volume). Com esta atitude pretende-se impedir a proliferação microbiana, e assim prevenir a probabilidade de se induzirem alterações nas taxas sanguíneas dos referidos tóxicos.
As metodologias de investigação passam por uma série de fases: rastreio, confirmação, quantificação e interpretação. Iniciam-se por um teste geral (que detecta um grande número de substâncias, permitindo fazer uma triagem de casos negativos) e, só numa fase posterior se recorre aos métodos de confirmação (que permitem confirmar a presença de substância suspeita, bem como identificá-la e/ou quantificá-la).

As técnicas de análise toxicológica variam desde os clássicos métodos não instrumentais, tais como reações volumétricas ou colorimétricas, até outros mais sofisticados para os quais se recorre a tecnologia apropriada, simples ou acoplada, como as técnicas espectrofotométricas (ex: espectofotometria de absorção molecular - UV-Vis, de infra-vermelhos - IR ou de absorção atômica - AAS), cromatográficas (ex: cromatografia gasosa – GC e cromatografia líquida - HPLC), imunoquímicas (ex: Elisa, imunoensaios com fluorescência polarizada – FPIA ou radioimunoensaio - RIA), e de espectrometria de massas - MS.
O resultado destas perícias apresenta-se na forma de relatório onde devem constar, para além de uma eventual interpretação dos resultados, os seguintes dados: identificação do processo e da entidade requisitante, método analítico utilizado e referências à técnica de isolamento utilizada, datas de recepção de amostras e de conclusão dos exames, amostras analisadas, especialista responsável pela execução das análises, níveis de detecção e de quantificação, estado das amostras analisadas, e outros que possam ser considerados relevantes para elaboração de conclusões.
Geralmente, o Laudo de Perícia Toxicológica é enviado ao Perito-Legista que requisitou a perícia, sendo posteriormente remetido à entidade requisitante isoladamente ou em conjunto com o Laudo de Autópsia ou de Clínica Médico-Legal.
O registro de mortalidade decorrente de efeitos indesejáveis agudos e subagudos possui relação bastante específica com a exposição de substâncias químicas e consiste uma importante estratégia empregada em estudos de utilização e monitorização destas, sobretudo no que se refere a fármaco ou toxicovigilância.
É importante sublinhar que nesta perspectiva, a informação decorrente dos Laudos Toxicológicos Forenses constitui um parâmetro de fundamental importância para o estudo de utilização das substâncias químicas, sobretudo ao que se refere aos eventuais efeitos deletérios decorrentes do uso para os diversos fins.
Para saber mais: 
- RANGEL, R. Noções Gerais sobre outras Ciências Forenses. Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Medicina Legal - 2003/2004. Disponível em: <http://medicina.med.up.pt/legal/NocoesGeraisCF.pdf>. Acesso em: 01 de novembro de 2011.
 - LEVANTAMENTO DE LABORATÓRIOS ANALÍTICOS DE TOXICOLOGIA FORENSE. Pesquisa elaborada pela Gerência Geral de Laboratórios de Saúde Pública – GGLAS. Disponível em: <www.anvisa.gov.br/reblas/pesquisa_toxicologia_forense.pdf>. Acesso em: 01 de novembro de 2011.
   - ALVES, R.S. Toxicologia forense e saúde pública: desenvolvimento e       avaliação de um sistema de informações como ferramenta para a vigilância de agravos decorrentes da utilização de substâncias químicas. Fundação Oswaldo Cruz Escola Nacional de Saúde Pública Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, 2005. Disponível em: <www.fiocruz.br/sinitox_novo/media/artigo7.pdf>. Acesso em: 01 de novembro de 2011.

Nenhum comentário:

Postar um comentário